quinta-feira, 3 de outubro de 2013
Por: Leandro de Santana Santos*
A modernidade devora nossos dias, a enxurrada de informações e o crescente volume te tarefas cotidianas me dá à impressão que os dias estão mais curtos.
Já vivemos o que nos anos de 1990 chamava-se de futuro, porém esse futuro não é em nada parecido com o que se imaginava, almejavam-se cidades limpas e desenvolvidas, tecnologias que facilitassem a convivência e a mobilidade. Caricaturava-se até mesmo esse futuro idealizado no seriado de desenhos “Os Jetsons” que viviam em cidades aéreas, tinham empregada e cachorro robôs, carros voadores entre outras inovações. Mas, como já cantava Renato Russo na sua bela canção Índios que embalou minha adolescência “O futuro não é mais como era antigamente”. Hoje o que percebo beira o caos, cidades mal planejadas, super populações, poluição, transito caótico, cada um por si e todos por ninguém, disputando um lugar ao sol, não temos amigos, temos concorrentes, vivendo em um mundo de aparências onde o que realmente importa é o ter e não o ser, esse é o nosso admirável mundo novo.
Nesse contexto a memória nostálgica é um bálsamo que nos mergulha em temporalidades perdidas pelo tempo linear da modernidade, como elemento regenerador de identidades. É interessante notar o efeito do exercício do lembrar, remeter-se ao passado e por alguns segundos sentir-se de volta a velha casa, ao conviveu de velhos amigos e até mesmo sentir cheiros de antigamente como o perfume daquela garota que nos marcou.
De modo, que existem lugares que funcionam como gatilhos de memória,a Praça Filomeno Hora, a feira de todas segundas, a igreja aos domingos, a escola primaria “Cantinho do Saber” que ainda conserva a velha fachada, o jornaleiro do “Forrodromo”, O Louvor Sertanejo, O Tecendo a Manhã. São lugares e manifestações que formam minha identidade, dai se explica a relevância que tem hoje o preservar, os tombamentos avançaram, são patrimônios municipais, estaduais, nacionais e até mesmo mundiais, tangíveis ou intangíveis, embora a minha cidade tenha apenas um, O Grupo Escolar Sílvio Romero, temos muito que aprender.
Dentro dessa perspectiva, noto o verdadeiro sentido, o estatuto da memória, o seu papel na vida humana. Diferente da história quanto matéria de estudo carregada de uma metodologia e de um estatuto epistemológico próprio, a memória como afirma Jacques Le Goff, em se livro História e Memória “remete-nos em primeiro lugar a um conjunto de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações passadas, ou que ele representa como passadas” (p.419). De modo que é um campo subjetivo despreocupado com noções técnicas de releituras do passado. Mas são fontes imprescindíveis para a construção da história, por ter a força de voltar ao passado com mais propriedade até que os textos, “A letra mata” petrifica, esquematiza, disseca, já a memória vivifica, de modo subjetivo é claro, mas, isso não a tornaria funcional? Ki-Zerbo em seu livro História da África nos lembra: qual mensagem não é funcional? Todas são, cabe aos historiadores filtra-las a fim de extrair o quanto for possível de objetividade.
Mas por que lembrar? Da mesma forma que necessitamos da nossa memória individual para viver e sem ela essa vida não seria possível em igual importância esta a memória coletiva do meu povo da minha nação, de modo que sirva para vivificar e motivar a minha e a nossa consciência. Tomemos como exemplo o caso da África que até bem pouco tempo especulava-se que era um povo sem história, por não dominar a escrita em seu passado, condenando esse povo a uma vida sem identidade própria sem o que lembrar desprovida de orgulho nacional. Oxalá essa perspectiva tem mudado com o tempo e essa visão estereotipada da África vai caindo por terra. A cada ano aparecem dezenas de novas publicações cuja óptica e cada vez mais positiva. O reconhecimento da história oral, da arqueologia, ou de qualquer outro objeto que testemunhe o passado como fonte histórica esta dando a África uma identidade que lhe é própria.
De modo, que nesse sentido a tese que “A memória nostálgica é um instrumento dinâmico de recuperação de territórios e temporalidades perdidas pelo tempo linear da modernidade” é perfeitamente aplicada, é em grande parte a memória do povo africano que tece sua história, construída pelo seu próprio povo, pelos seus próprios historiadores.
Assim sendo, deixo aqui o apelo pela preservação da memória dentro dessa loucura da modernidade, preservemos fachadas, igrejas, escolas, praças qualquer lugar que seja que traga em si um pouco da nossa história.
Referências Bibliográficas:
-KI-ZERBO, J., “Introdução geral”, in J. Ki-Zerbo, ed. História geral da África, I: Metodologia e pré-história da África. São Paulo: Ática/UNESCO, 1982, pp. 21-42.
LE GOFF, Jacques., “Memória”, in Jacques Le Goff, 5° ed. História e Memória. Campinas, SP: Unicamp, 2003, pp. 419-471.
DE MORAIS FERREIRA, Marieta e AMADO, Janaína., “Memória e o passado nacional”, Marieta de Morais Ferreira e Janaína Amado, 2° ed. Usos e abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, pp. 85-87.
Leandro de Santana Santos graduando em história pela Universidade Federal de Sergipe.
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- Renato Araujo Chagas, graduado em História pela Universidade Federal de Sergipe.
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