terça-feira, 8 de outubro de 2013
Da esquerda para a direita, Sandra, Solange, Celso e Marcele

Nos últimos anos, a legislação do país vem buscando oferecer meios para que pessoas com algum tipo de deficiência possam estar incluídas em todas as esferas da sociedade. Assim, a educação também passou de certa forma por grandes mudanças, uma delas diz respeito ao ensino de Libras nas escolas para que pessoas com surdez possam acompanhar o desenrolar das aulas. No entanto, os profissionais da educação em sua maioria não têm o domínio, ou às vezes nenhum conhecimento sobre a língua de sinais, o que possibilita um constrangimento tanto para o aluno, como para o professor.

Pensando nessa e em outras possibilidades, foi que se tornou obrigatório o ensino de LIBRAS nos currículos dos cursos de Pedagogia e de licenciaturas nas universidades, a fim de preparar os futuros professores a lidarem com a situação em sala de aula. Foi nessa realidade que me matriculei na disciplina agora obrigatória para o curso de história. Com muita dificuldade fui aprendendo alguns sinais e enxergando o mundo com outras lentes. Através de uma proposta ousada da professora Larissa Rebouças, que desafiou seus alunos a levarem um vídeo com pessoas surdas para sala de aula, fui instigado a conhecer a realidade mais de perto de jovens da comunidade onde moro, assim, convidei alguns estudantes da UFS para minha querida cidade, e fomos conhecer uma exemplar história, que além de surpreendente, foi a confirmação que estávamos diante de uma família onde a superação é a palavra de ordem.

Família reunida com mãe e filhos
 
 
“O surdo: um estrangeiro em seu próprio país”


Sandra
Muitas famílias descobrem desde cedo que seu(s) filho(s), apresentam aspectos um pouco diferente do normal, não respondem aos chamados dos pais, não percebem alguns ruídos que estão a sua volta. São crianças que por algum motivo, vieram ao mundo desprovido da percepção sonora.  Porém, nenhuma família chama tanto a atenção e a curiosidade da sociedade lagartense como a família Oliveira, residente no Bairro Cidade Nova, na estrada dos “MUDOS”. Sandra, Celso, Solange e Marcele, quatro dos oito rebentos de Dona Edite e seu Pedrito in memória, vieram ao mundo com ausência auditiva.

Desde cedo, mais de perto com um ano de vida, os pais já perceberam algo de diferente em sua primeira filha Sandra. Com a primeira experiência, as outras três foram notadas com maior facilidade, contudo, para uma família pacata e desprovida das informações necessárias para lidar com o problema, o medo, as dúvidas e as angústias por não conseguirem atender as necessidades dos seus filhos causaram danos irreparáveis.

Marcele
Os anos passaram-se, aquelas crianças até então indefesas cresceram e em meio às dificuldades que a vida proporciona ao ser humano, conseguiram superar todas as barreiras enfrentadas, cada uma a seu modo buscaram um lugar ao sol. Sandra, Solange e Marcele tiveram chances de frequentarem os bancos escolares, porém, o ensino que até o momento não atendia à demanda de uma prática voltada para lidar com a deficiência, o fizeram desistir de frequentar as aulas; quem mais estudou, permaneceu por quatro anos. Já Celso, que desde cedo enfrentou o sol defronte a um cabo de enxada, não teve a mesma oportunidade educacional.

 A comunicação que utilizam é a adquirida no cotidiano através de gestos, mímicas, o que fazem ser de certa maneira compreendidos. Se em casa o diálogo flui com facilidade pelo convívio, no contexto social muda um pouco de sentido, mesmo sendo acolhidos por amigos, é notória a dificuldade para alguns manterem uma relação mais dinâmica.

Porém, quem imaginar que esses irmãos se fazem de coitadinhos para vencerem na vida, se enganam. Com entusiasmo e perseverança todos foram à luta, buscaram seus espaços na sociedade e redefiniram um novo meio de vida. Sandra é uma das mais conhecidas na cidade por ter dedicado 20 anos de sua vida ao hospital N.S. da Conceição. Descontraída, de bem com a vida conquista todos que a conhecem. Celso homem simples e sereno, trabalhou por anos na produção agrícola, hoje suas atenções estão voltadas para o trabalho realizado nas empresas Maratá na cidade de Itaporanga D’ajuda, a fim de oferecer uma vida com maior sustentabilidade a sua esposa e seus 3 filhos.


Solange
Solange e Marcele, as mais novas do quarteto, representam uma geração de jovens descontraídas, radiantes e felizes com o grande número de pessoas que fazem questão de cultivar amizades e incluí-las carinhosamente no meio em que vivem. Ambas são casadas e trabalham nas empresas lagartenses, assim vão abrindo caminhos e alcançando conquistas diariamente. É importante ressaltar que existe no íntimo de cada uma, um profundo desejo de continuar seus estudos, mas ao longo da vida o ser humano também é atraído por situações diversas como casamento, filhos e a necessidade de trabalhar para suprir necessidades pessoais.

 “Somos diferentes, mas não queremos ser transformados em desiguais. As nossas vidas só precisam ser acrescidas de recursos especiais” Sem dúvida a mensagem imortalizada através da peça de teatro: vozes da consciência de BH, mais que uma reflexão é um grito que ecoa no silêncio de pessoas que nasceram sem um dos cinco sentidos do corpo humano: a audição.

Celso
Não ser compreendido e não ter a oportunidade de se fazer compreender dentro do espaço em que se vive, é a maior forma de exclusão que se pode praticar com o ser humano. Mesmo vivendo num momento em que as práticas educativas estão caminhando para uma inclusão social, ainda precisamos unir forças em defesa daqueles que são vistos com indiferenças por serem diferentes. Os jovens mencionados são exemplos de superação e nos fazem refletir sobre a ótica de que ser alguém na vida não perpassa pela condição de sermos perfeitos fisicamente mas, sobretudo pela coragem de enfrentarmos os obstáculos, transpor as barreiras e provar para todos na prática que “ser diferente é normal”.

Estudantes da Universidade Federal de Sergipe (UFS) em visita à família
 

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